domingo, 4 de julho de 2010

Origens da Linguagem

Em meio à discussão sobre quem nós somos, de onde viemos e para onde vamos, o livro “Origens da Linguagem” é uma ótima opção para aqueles que desejam descobrir ou pensar acerca da língua. Formada em filosofia pela Universitá La Sapienza (Itália), a Dr. Bruna Franchetto em conjunto com a Doutora em linguistica Yonne Leite nos convida à uma viagem reflexiva sobre o processo de aquisição da linguagem pelos homens. Em seus 12 tópicos, o livro apresenta a trajetória da construção do saber humano sobre a comunicação entre seres.


Em resumo, “Origens da Linguagem” é uma obra que retorna ao cenário linguístico após alguns anos de ostracismo nos conduzindo às nossas origens, ou pelo menos ao pensamento de nossas raízes. Um pensar sobre a velocidade em que surgem novas teorias e todas as controvérsias que agitam as sucessivas e velozes mudanças culturais.

Dividido em 12 tópicos “Origens da Linguagem” apresenta, em uma linguagem clara e didática, a trajetória do pensar humano sobre a aquisição da língua, ou podemos dizer da nossa necessidade em nos comunicarmos. No inicio pensávamos que a linguagem fosse um dom dado por Deus (e talvez até seja) e que aprendíamos a falar por pura imitação, fato esse já relatado por Aristóteles. Imitamos o som e desenvolvemos a comunicação, mas foi na Grécia que a linguagem associou-se à razão.

Entretanto a discussão levantada pelas autoras nos provoca uma eclosão de pensamentos acerca dos tempos remotos da Roma Medieval, e não somente uma reflexão da divindade da aquisição da língua. Dessa forma é fácil compreender que o uso da palavra sempre fora utilizada como divisão de poder na sociedade e naquela época era um fato explicito. O interessante é refletir sobre o uso autoritário da linguagem oral em nossa atualidade, haja vista que tal situação ainda é vivenciada, principalmente nas relações em que envolvem comunicantes de níveis sociais diferenciados.

Outro ponto importante, levantado pelas autoras, é o encontro das diversas culturas e a forma como as mudanças sociais e políticas influenciam na modificação da fala humana. Antes havia o grego, depois o latim, depois as línguas românicas e assim uma influenciava outra em um processo continuo de aculturação.

“As mudanças sociais e políticas que se operaram como o reconhecimento de outros mundos tiveram consequências diretas nos caminhos da linguística, que se tornaram mais numeroso e complexos”

No excerto acima verificamos a preocupação em relatar o renascimento das letras e indicar o processo indo-europeu de formação da linguagem. Aliás o estudo é mais complexo e robusto quando falamos as teorias evolutivas. Nos tópicos/capítulos À procura da primeira língua e A teoria da evolução nos deparamos com o caráter da evolução dos animais com grande ênfase no homem.

A questão central são as reflexões que fazemos ao longo da leitura, quando ocorreu a bipedia e encafalização? Por que somente nós falamos palavras articuladas? O que nos diferencia de outros animais? Perguntas como estas são amplamente levantadas no tópico/capítulo a origem da linguagem: uma agenda aberto.

Não deixa de ser um livro atraente, embora designado para poucos: os que realmente desejam engajar no conhecimento linguístico histórico de nossa sociedade, com o saudoso resquício e a pureza da arte não-comercial. Também se destina para os admiradores das escritoras, pelos minuciosos detalhes nos dado ao longo das páginas de coesão e riqueza de fatos. E, finalmente, também é feito para os leigos, ávidos por conhecer mais do que curiosidades sobre a diva. Para estes, e para todos nós, é preciso aprender um pouco mais sobre o que diz o saber linguístico que percorre em nossa mente.

A Máscara de Betatron - Ensaio sobre as múltiplas personalidades humanas presente no conto “Corações Solitários” de Rubem Fonseca.

Sempre nos escondemos atrás de alguma coisa. Pode ser muito trabalho, pode ser pouca diversão, pode ser pelo fato de não querermos que os outros conversem conosco. O fato é que todos se escondem. “Minha vida é um livro aberto” é a frase de efeito usada por todos aqueles que afirmam não possuírem nada a esconder, mas é bom lembrar que todo livro possui parágrafos de difícil interpretação.


Em Corações Solitários, Rubem Fonseca apresenta o drama de um ex-repórter policial que inicia uma nova fase de vida profissional no jornal Mulher onde passa a ter duas atribuições: responder as cartas das leitoras e escrever as fotonovelas. No entanto em Mulher todos os escritores devem usar pseudônimos femininos, o que intriga nosso narrador-personagem. Após pequenas discussões (e persuasões, é claro) decide-se pelo uso no codinome Nathanael Lessa para responder as cartas que são inventadas pelo próprio narrador-personagem e Clarice Simone para assinar as fotonovelas.

Apelidos criados para homenagear Nathanael West, autor de Miss Corações Solitários, Ivan Lessa, jornalista e cronista brasileiro e um dos fundadores de O Pasquim, Clarice Lispector e filósofa francesa Simone de Beauvoir. Das quatro personalidades, destacamos Nathanael West pelo desenrolar da narrativa bastante similar ao conto de Rubem Fonseca.

Homenagens a parte, ressaltamos o papel do Dr. Nathanael Lessa em responder as supostas cartas de leitoras da classe C enviadas ao jornal Mulher. Histórias que ele mesmo inventara e respondia, com a anuência do Peçanha (Editor do Jornal), com certo teor de otimismo para as vidas das leitoras. Mas que leitoras? Situações criadas e personagem saídos dos devaneios de um ex-repórter policial que poderiam ser verdades, poderiam ser histórias de um povo sofrido, de um povo que clama por um ombro para chorar as amarguras da vida.

São fatos inventados por um personagem criado. Mais uma máscara em uma tentativa de mostrar à sociedade o realmente existe. São relatos como o da virgem louca que não sabe se cede ao namorado ou não. Quantas mulheres não sofrem o mesmo dilema, neste momento? Pressionadas por seus namorados, amigos ou colegas a praticarem o ato sexual sem o envolvimento emocional que dizemos ser tão importante e depois se escondem envergonhadas dos atos que foram obrigadas a fazer.

Quantas viúvas existem como a senhora deixada pelo marido e com pensão pequena, tendo que viver os dramas diários? Pessoas que possuem medos de sua própria existência. Nosso personagem Nathanael Lessa criou as cartas, mas não inventou os dramas.

Já a Clarice Simone, outro codinome do nosso narrador-personagem, é responsável pelo roteiro das fotonovelas entregues a Mônica Tutsi (o fotografo chamado Agnaldo). A primeira história nos apresenta o drama de Roberto e Betty, noivos e pretendem se casar. Influenciado pelo seu amigo Tiago, o noivo procura a casa da “Superputa” Betatron para tirar a sua castidade. Descobre, então, que Betatron é na verdade sua noiva Betty. Quem é a verdadeira? Betty que se esconde na pele de Betatron ou esta que deseja viver um vida pura na face de Betty?

São linhas como essas que despertam em nossa mente a dúvida: Queremos a chance de viver uma vida diferente da nossa? Escondemos-nos em codinomes, em histórias inventadas?

Lembro do filme Substitutos, estrelado por Bruce Willis. Na trama, ambientada em 2054, noventa e tantos porcento da humanidade trocou sua existência diária, de carne-e-osso, por androides substitutos da Virtual Self. No melhor estilo Matrix, os usuários podem sentar-se em confortáveis poltronas de conexão e projetar suas consciências em bonecos perfeitos.

A oportunidade de estar em um corpo completamente diferente do seu está devidamente pesquisada e registrada hoje em dia. O que é Second Life se não exatamente isso? Poder deixar o seu corpo para trás e embarcar em aventuras e situações que você não viveria de outra forma? Mas no mundo de Substitutos a opção parece meramente estética e sexual. Flerta-se usando um corpo do sexo oposto, praticam-se esportes radicais com mais frequência ou situações de risco são abraçadas sem medo... mas é só. Basicamente, as pessoas têm os mesmos empregos enfadonhos e a sociedade opera da mesma forma - só que todos são bonitos como Barbies e Kens.

É o que Rubem Fonseca apresenta em seu conto: Uma ironia exemplar nos mostra as facetas da sociedade escondida por rostos desconhecidos do Nathanael Lessa, Clarice Simone, Mônica Tutsi, Sandra Marina ou Elisa Gabriela. Local em que o autor não sabe para quem escreve e quem lê desconhece o autor.

Motivo que leva a crer que a vida passa a ser uma criação ficcional do autor, mas mesmo assim retrata a realidade. Imagem de uma sociedade que se esconde em máscaras para cada ocasião. Todos nós possuímos a máscara de Betatron: Puros na sociedade, corrompidos em nosso íntimo.